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Mostrando postagens de agosto, 2011

Silêncio

O silêncio diz tudo. A quietude que calmamente se espalha pelas bocas e ouvidos fatigados. Algo cala fundo, fala alto sem favorecer palavras. O verbo da criação é dispensável! Mentira velada é verdade resguardada. Segredos calados não fazem mal. Poço profundo esse do silêncio que permeia os corpos, os espíritos, os lençóis. Desse que não se pode citar em voz alta. Desse que só os olhares discorrem. E escorre esse emudecer, inundando a alma, a cama. Inundando a boca. Quantas bocas transbordam nesse não-falar? Sejamos claros, cada silêncio vale uma virtude. Cada possível virtude que se perde naquele anteceder do sigilo. E todos os pecados berram, satisfeitos, dentro daquele silenciar...

Já Chega

Chega! Chega a hora de tomar um rumo, de dar um jeito, de puxar as rédeas. Já chega! Chega de lamentar as tentativas frustradas. Chega de tentar. Chega de olhar o horizonte com aquele sorriso besta de quem vai quebrar a cara outra vez. Chega! Chega-se a um limite. E há limite para quase tudo na vida. Se há começo, há de haver final. Chega-se a pensar que não há. Já chega! Chega de procurar a saída do labirinto, o fundo do abismo, ou do copo. Chega o momento da libertação. Chega! Chega de enrolar a lã no novelo dos dias. Chega de esperar a solução. Chega de lutar, de bater contra o muro. Chega-se ao final da jornada quando se decide parar de andar. Chega, enfim, o começo. Chega de esmolas, chega de memórias, chega de frio. Já chega! Cheguei!

Concessões

Eu não mais farei concessões. Sejam quais forem. Sob qualquer pretexto. Não mais andarei sobre lâminas tensas por amabilidade ou proteção. Posto que essas reverências são impostas, não compartilhadas. Tampouco retribuídas. Eis a regra da contradição, do amargamento da boca. Eis o sentimento de furto, de engodo. Eis. Quando me dobro por ti e nada tenho em retorno. A partir de agora, já não terei a piedade de ceder as tuas vontades. Não me interessam mais teus olhos de labrador, tuas necessidades sempre urgentes, teus mil compromissos inadiáveis. Já basta! A partir de agora, o que quiseres de mim, terás de me dar em troca. E como sei que és incapaz de tal façanha, exerço meu poder de barganha e te digo um sonoro “não”. Sou má? Insensível, quem não diria? Pobre diabo, tão maltratado pela bruxa. Pobre de ti. É realmente uma lástima de homem, tão moralmente traído por esta que já não vai te servir. Que digam dessas balelas pelo tempo que quiserem. Não me custa. Pois que todos os meus t

Eu Quero!

Eu quero ter um milhão de amigos, disse Roberto. Eu quero a sorte de um amor tranquilo, recitou Cazuza. Eu só quero um amor que acabe o meu sofrer, segundo Gil. Eu quero você, como e quero, by Kid Abelha. O que eu quero? E o que eu quero serei eu a querer? Sim, a eterna permuta do ser. O que quero, o que sou, o que tenho, o que conquisto, o que posso. E eu quero apenas olhar os campos? Não! Claro que não! Quero a fumaça cinza das fábricas. Eu quero só você. Quero o poder de querer e de conquistar. De brandir espada e reluzir escudo. Quero a morte o a sangue nas mãos. Quero eliminar inimigos, fazer reféns, queimar palácios. Quero a luta e quero o prêmio. Quero a virtude da donzela e a paixão do efebo. Quero a sapiência do vizir e quero a diplomacia do bárbaro. Quero fazer de ti meu escravo, meu consorte, meu tesouro. E te pilhar. Eu quero a vastidão devastada do peito apaixonado, da mente embotada pelo corpo nu, dos sentidos frenetizados pelo cheiro da carne. Quero tua carne crua, se

Irrepreensível

Essa sua dualidade é impensável. Irrepreensível. O que mais dizer?... E quando você vem, assim, manso... procurando colo, procurando achego, procurando consolo, quem sabe. Como resistir a você, a esse seu charme criança, essa doçura infantil regada a puro sex a peal? Como resistir? E você ainda ousa dizer que não é amado, que não é bonito, que não é! Blasfêmia, heresia, pecado mortal! Logo você, fonte inesgotável de beleza tão rara. De vontades tão rasas. De desejos pueris. Logo você, fonte absoluta de meus anseios, você que eu venero como se venera a um Davi... assim, de longe... Logo você vem dizer que é menos que esse tudo e que tudo se revela em nada em você. Mentiras, mentiras. De alguém que ainda vê o mundo com os olhos da puberdade recém perdida. Da fragilidade, da infância arredia, da inocência. Inocente, sim! Que mais dizer? Alguém que não imagina o quanto é perfeito, o quanto é belo, o quanto é! O quanto ainda pode ser... E perdôo-te qualquer pecado, esses de arrogância, d

Consciências

Rapidamente, ela percebeu que era descartável. Ou que as pessoas ao redor eram descartáveis. Meros decalques num álbum de figurinhas incompleto. Tudo bem, não foi tão rapidamente assim. Foi preciso um dia em especial, uma noite em especial. Uma única noite de sábado na qual ela estava livre. Livre de gritos, de manhas, de brinquedos, de obrigações. Quatro anos depois, uma noite sem sua filha em casa. Naquela mísera noite, ela podia sair, viver. Quem sabe, trazer um corpo para aqueles lençois estéreis. Afinal, não era feia, não era velha. Era uma mulher na plena consciência de si mesma. Todavia, quando tentou conseguir companhia  - inofensiva - para a noite de sábado, a companhia daqueles e daquelas que se diziam amigos e que, por isso, deveriam dividir um prato, um copo, um riso... ninguém apareceu. Nada, como se ela não existisse como se aqueles mesmos que desfrutavam sua casa, meses antes, não a conhecessem. E foi quando ela se deu conta de que não tinha amigos. Amigos são pessoas

Inspiração... a quatro mãos

Comecemos numa noite escura. Como esta que faz aqui, agora, fria e estrelada. Poderia te falar da noite e da lua crescente que tem no céu. Mas, não quero te escrever uma carta. Tampouco um diário. Quero apenas essa conexão... talvez fosse o que faltava. Voltemos à noite escura.   Gosto de andar nas noites da minha cidade quase fantasma. Gostos dos meus fantasmas com sotaque sulista. E meus fantasmas me visitam quando escrevo, pairando por cima do ombro pra espiar entrelinhas. Você entende? É sempre noite quando escrevo, mesmo que seja dia. Mas não vou te contar meus dias. Só as noites. Só as entrelinhas. E, quem sabe, possamos compartilhar fantasmas. A ideia te agrada?

Crise de Inspiração!

Acabei de ouvir de um amigo (homem, óbvio!): "Nada melhor que uma boa trepada pra inspirar!" Discordo! Alguém concorda? Comigo ou com ele? Sexo feito é sexo gozado e gozo é inspiração derramada. Seja derramada ou não! Inspiração é tesão que não se manifesta, não se concretiza, é desejo velado, transgressor. Inspiração é querer aquele corpo (aquele!) mais que a sanidade permite admitir. É daí que nasce o gozo do texto! Aquele que mela as teclas enquanto a gente delira... Discordam?...