Sou Velha

Dia desses, mandaram me dizer que eu sou velha.
E eu concordo em todas as instâncias.

Vejam, não me disseram que "estou" velha, mas que "sou" velha. O que implica uma diferença significativa. No meu julgamento, a declaração não tem a ver com idade. Tem, sim, uma tentativa de ofensa que, em verdade, é verdade!

“Ser” velho significa finalmente absorver os ímpetos de juventude, os arroubos de aventura e os sonhos megalômanos de um futuro esplêndido. Significa uma calma que só os que são velhos têm, significa encarar o tempo passivamente, como se fôssemos, eu e o tempo, velhos amigos jogando xadrez.

“Estar” velho é sentir-se menos jovem, é a contagem de anos pesando sobre as articulações e a ânsia dolorosa de querer voltar no tempo. Desses males, fora a lei da impiedosa gravidade, não sofro nenhum.

Não choro pelos perdidos ímpetos de juventude porque jamais os perdi. Ainda invento mundos fictícios e brinco com amigos imaginários, ainda visto-me de personagens e personalidades e sou qualquer coisa e qualquer um. Posso ser o que quiser ser, e o sou na integralidade da minha ficção. Isso inclui os arroubos de aventura, obviamente.

Quanto aos sonhos megalômanos de um futuro esplêndido, já os vivi a todos. Sim, realizei-os e ainda os realizo diariamente. Meu futuro sonhado, há tempos é o meu presente, minha realidade. Talvez eu tenha sonhado pouco. Mas garanto que sonhei o suficiente!

Alguns exemplos?
Um dia eu sonhei ser romancista: meu primeiro romance foi publicado em 2012. Já foram três a público e ando trabalhando em mais alguns. Um dia quis fazer cinema: tenho seis prêmios na estante (junto com meus livros). Um dia sonhei ser mãe: minha criança tem 8 anos e é minha criação mais perfeita. Um dia sonhei viver de escrita: sou escritora profissional há uma década (sim, isso é possível!). Estudei magia, formei autores, tive alunos, toquei instrumentos (ainda que muito mal).

Tudo isso eu fiz e sigo fazendo. Não descarto a possibilidade de mais alguma conquista. Mas, não, não tenho mais nenhum mega ideal. Realizei-os um a um. E todos os desejos que ainda vierem, eu os realizarei. Não tenho qualquer dúvida.

Minha vida me deu conteúdo, experiência, a certeza de que posso sorrir e administrar com cuidado e leveza tudo isso que fiz. E, sim, essa é uma consciência velha. Da velha que sabe que o futuro só importa a quem não é pleno no hoje. Da velha que viveu anos gloriosos, amores imensos e crises catastróficas (e, creiam, muito disso tudo ainda há para viver).

Por tudo que vivi, afirmo e concordo: sou velha! Sei que esse parece o discurso de alguém com 82 anos, não com 42. Sei que me autoafirmo (jamais disse que era perfeita!). E sei bem que a maioria dos jovens – e dos que estão velhos – discordará de tudo o que eu digo aqui. É a vida, não discuto (mais) a opinião alheia.

Para quem me mandou tão sábio recado, eu agradeço de coração e retribuo com um “velho” conselho: pare de se preocupar tanto comigo e faça o que eu fiz. Vá viver!

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